O AZARADO

A Vila Élvio do meu tempo, e talvez ainda hoje, não dispunha de saneamento básico, o que constituía um grave problema. Assim, muitas vezes, a solução era apelar para os detestáveis urinóis, esvaziados com certa freqüência. Dentre as muitas casas da vila, morava a dona Rosa, mãe da Jorgina, que namorava com o Antonio, também morador da vila.
Certa noite, dona Rosa estava na casa dos pais do Antonio e a conversa girava em torno da serenata que o Antonio fizera para a Jorgina.
A dona Rosa dizia que se comoveu com a serenata e que a filha homenageada até chorara. O pai do Antonio, enojado com tal tipo de conversa, resolveu sair de casa para espairecer, após ouvir tanta baboseira.
Saiu e passou sorrateiramente rente aos quartos de diversas casas e, inesperadamente, ao passar pela casa do Belmiro, foi premiado com respingos da urina, porque nesse momento a dona da casa esvaziava o urinol.
Meu pai, que trabalhava para a firma, sofrera um acidente e não mais podia fazer serviços pesados. Foi-lhe dada então a função de guarda-noturno das serrarias. Era a época do frio e ele sempre fazia uma pequena fogueira em local adequado.
Ali chegou o nosso amigo. Respingado e com cheiro nauseabundo de amônia contou sua desdita, aproximando-se da pequena fogueira na suposição de que o calor fizesse evaporar aquele cheiro fétido.
Temia voltar logo para casa e ainda encontrar a dona Rosa, que poderia inquiri-lo sobre o que seria mais agradável: ouvir calado a conversa sobre um amor incipiente ou retornar em condição lastimável e mais nervoso.